sexta-feira, 23 de maio de 2014

exercício XIV - porquê?



Repito o teu nome com os
dedos em ferida. a máquina
de escrever a romper o tecido
entre os olhos; atrás dos animais,
os bonecos de corda a correr
de um lado para o outro em
cima da bancada.  
cortar o sobrolho
dentro do peito para tirar um
pêlo encravado. os brônquios
ainda a dançar o fogo do tempo
cansado; das vidas acabadas
nos recantos cíclicos da chuva.
come-me os braços enquanto
posso sentir os teus dentes;
um pedaço de carne infectada,
putrefacta; consciente.

a tua voz a é um soçobro lapidado
na mente. 

quando fecho os olhos e os teus
lábios se aproximam;
quando os olhos se abrem
e o beijo se afasta; o calor
das palavras desaparece
logo na sinopse do amor.
humedeço a distância
silenciosamente.
as cartas debaixo da
cama mas o punhal
no braço esquerdo,
o elástico, o calor do
tempo a lembrar apenas
que estou sozinho.
fecho a porta da casa de
banho e espero por ti;
o aço que interrompe
o caminho do coração
e acelera as palavras todas
que ficam por dizer. 

esculpo a ausência
numa folha em branco.

outro risco aleatório
a delimitar o lábio superior
e inferior
respectivamente.


quinta-feira, 15 de maio de 2014

etiqueta



tenho um castelo de cartas
debaixo dos pés;
o rascunho de um poema
no punho fechado e
nenhuma boca a dizer
que o sorriso pode
despertar o silêncio
imóvel. 

se chorares abraça-me.
fecha-me os olhos com
um beijo que se possa
guardar,
ainda,
depois
do amor.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

gaveta VII



quando era criança
e no pescoço perfurado
cabiam dois dedos
pequenos; a pele de fora
como nos filmes a derreter
com o calor do incêndio
e as planícies entre as
mãos, os pés, os braços
abotoados aos lábios
de outro amigo morto;
uma guerra de silêncios
e um baralho de cartas
viciado. 

conto uma história de
amor
num quarto vazio.
aperto o elástico
com os dentes;
sou o vértice de um
poema. 

o tabaco no chão e
a roupa espalhada
entre as lágrimas
que arrumo;